Não reparei quando é que a senhora de olhos enevoados e cabelo no ar se sentou ao meu lado no Intercidades. Mas desde logo imaginei que não tivesse tido qualquer tipo de atenção ao lugar ou à carruagem ditados pelo bilhete. Nos bancos ao lado, um casal «urbano» ofereceu-se para ajudar a velhota. Alta e pálida, a moça, que iria toda a viagem a tagarelar sobre uns gráficos que mostrava ao namorado num mac, foi peremptória mas meiga ao sentenciar: «A senhora está no comboio errado».
Pouco preocupada e até risonha, a velha, cheia de sacos de plástico como todas as velhas como ela, desculpava-se: «Mas disseram que este era o Intercidades...».
Ia para Santarém e ainda a ajudei a perceber se já estávamos a chegar a essa estação. «No Natal não disseram e eu quase que deixava passar!», queixou-se. «Por isso é que vou sempre a olhar pela janela. Eu desta vista não vejo bem. A esta já fui operada mas voltou ao mesmo».
Despediu-se com desejos de boa viagem e Páscoa feliz. Acho que todos - eu, o casal urbano e o seu mac - partilhámos um alívio silencioso por o revisor só ter aparecido depois de a mulher sair do comboio.
Há 13 anos
Sem comentários:
Enviar um comentário