Agradecendo os comentários elogiosos dos benfeitores que não só não me criticam pelo tempo passado no sofá, como até (lhe) acham alguma piada, regresso hoje, num Domingo de trabalho, aqui ao cantinho esverdeado.
De outras cores se pintam os programas da manhã das nossas televisões. Já vos tinha falado no fantástico pivot de exteriores da RTP, a quem a Praça da Alegria, não sei se por ausência do Jorge Gabriel, abriu as portas do estúdio, esta semana. As minhas atenções dirigem-se assim, e desta feita, para o "SIC 10 Horas", apresentado pela Fátima Lopes (que outro dia apresentava, também, num sonho que tive, um programa sobre violência doméstica. Mas isso agora não interessa -- mesmo -- nada).
No dito "SIC 10 Horas" (adoro a subtileza do lembrete... não começa nem às 9h, nem às 11h! É mesmo às 10h!), flutua uma rubrica que dá pelo elucidativo nome de "Tertúlia Cor-de-Rosa". Para lhe dar corpo, há um ror de convidados fixos que se alapam frente às câmaras, de microfone na mão e cérebros a mil, para comentar a vida dos outros: mas com a desculpa de, no fundo, não estarem a falar da vida dos outros, mas sim do tratamento que é dado pelas revistas (inevitavelmente cor-de-rosa) a essas mesmas existências, famosas e mediáticas.
Ainda há quem diga que se perdeu o espírito das conversas de café, dos planos intelectuais que se traçavam nos grandiosos salões de chá que, para alegria dos meus olhos e gostos arcaizantes, se continuam a encontrar um pouco por todo o país. Hoje, podem não se orquestrar revoluções nem discutir obras literárias enquanto se «psst-chama» o empregado, mas leva-se o conceito mais além. Na televisão, discute-se a forma como os outros falam de terceiros. Faz lembrar as clássicas caixinhas de fermento royal e sua permanente fuga para o infinito.
Na semana que passou, decidi atentar com mais apuro na tal tertúlia de cor rota. Este é, justamente, o tipo de programa que convém ver mais de uma vez, para nos certificarmos que a coisa existe mesmo, não resultando portanto de um delírio matinal, provocado pela remela que o duche ainda não levou.
Em fila desordenada sentavam-se os comentadores convidados, à excepção de Marta Cruz, de férias em Cabo Verde com a mãe, Marluce. E nada melhor que começar a tertúlia daquela manhã exactamente cortando na casaca da jovem modelo! Ou, para ser mais rigorosa e politicamente correcta, na forma como as revistas de sociedade e televisão falam da menina, atribuindo-lhe paixões que não passam de amizades, ou «climas naturais, entre dois jovens bonitos». E, o que é pior!, bradam as sumidades da imprensa, dando informações contraditórias, em cada uma das publicações.
Conhecendo a lógica (?) que subjaz (??) às revistas que inundam prateleiras de supermercados e estações de serviços de há uns anos para cá, e não sendo propriamente defensora do pardieiro de vidas pessoais e inanidades que enche as capas das ditas, não posso senão achar hilariante que exista um programa para comentar, e criticar, as notícias que as mesmas trazem à estampa.
É curioso que aqueles analistas tanto se indignem com a falta de rigor da informação divulgada, ou com a atenção dada «aos romances» das estrelas, apelando a que se fale mais do seu desempenho profissional... quando a sua própria aparição no "SIC 10 Horas" depende das revistas zurzidas.
Faz-me pensar num abutre a lamentar a quantidade de gente que se perdeu no deserto e a cujas carcaças teve de dar um gastronómico destino.
O que vale é que, mesmo que o "SIC 10 Horas" não tivesse dado à luz a "Tertúlia Cor-de-Rosa", comentadores da estirpe da modelo Raquel Broegas (*) ou do cabeleireiro Eduardo Beauté (quem?) teriam, graças aos seus reconhecidos méritos, lugar garantido em qualquer programa de grande audiência.
(*) Também não sei quem é, mas, surpreendentemente, o tema que mais a fascinou, naquela manhã, foram os múltiplos namorados da Marisa Cruz, num espaço de poucos meses. «Eu começo a pensar que se trata apenas de uma manobra de marketing», vaticinou a parte completamente desinteressada.
Há 13 anos
Sem comentários:
Enviar um comentário