Não saberia muito bem o que dizer, se me perguntassem porque é que gosto tanto do Mark Eitzel.
Para despachar a questão em poucas palavras, e nunca faltando à verdade, podia responder que o considero um escritor de canções formidável, um letrista milagroso, um cantor imaculado. É a minha voz favorita - diria eu, e acho que isso era sentença para rematar qualquer argumentação. Sem nunca faltar à verdade, repito.
Mas não estaria a dizer tudo. Por que razão à meia-noite de Sexta-feira me encontro eu sozinha na sala de espera dos cacilheiros do Tejo, com o Oceano Pacífico da RFM como única companhia?
Há mais qualquer coisa no Mark Eitzel que me atrai e me impele a não dispensar um concerto, sempre que seja (minimamente) possível lá chegar.
Talvez seja o facto de, entre ele e o velho tolinho que, na viagem de barco para o Barreiro, gritava «Baixem os cornos!», não haver assim tanta diferença. Quando cheguei ao auditório onde a banda ia tocar, ainda surpreendida com o facto de ter dado com o sítio, vejo um gigante de boné e camisa aos quadrados junto a um laguinho de água suja, com patos. Era o Mark Eitzel a falar com os seus músicos, julgo. Rindo e esbracejando, diz quem sabe que entusiasmado com o jantar bem regado que trazia no bucho.
Por mais de uma vez falei com o senhor. Desta feita a timidez levou a melhor e para chegar ao café até fui à volta. Depois passei o concerto com vontade de lhe dar um abraço, uma palavra de carinho, um cafuné. Não é pena que sinto pelo Mark Eitzel, mas uma empatia tão grande que raia a ternura. Empatizo muito com gente humana, e a humanidade do Mark Eitzel é tão grande e desengonçada como o seu corpo embrulhado num fato de fraco corte.
Mas quando canta, ele abandona qualquer humanidade, qualquer mortalidade, e é simplesmente uma voz a pairar acima do palco, acima das estrelas (que ele canta neste último disco dos AMC), acima dos seus pés de barro de palhaço pobre de uma terra maldita, que adora.
«Quem me dera que San Francisco se separasse da América e se tornasse um país independente», diz a certa altura. «Portugal is so free», desabafa noutro momento.
Saio sempre bem de um concerto dele. «Podia ser um Guimarães dos pobres», disse-lhes eu, esperançosa, quando cheguei. Não estavam lá comigo, e fez diferença. Mas lá diz o Outro, e (sempre) com razão: Amar é bom se houver/No fundo de um de nós alguma solidão.
Apesar da mitralhada que se veio a embebedar no bar do cacilheiro, no caminho de volta, estava bonito o rio à noite.
(foto da incrível Vera Marmelo)
Há 13 anos
1 comentário:
Pesou-me a tua sms nessa noite. A minutos de ver o melhor "joker" de sempre, ficou a morder um arrependimento grande de não estar lá e nostalgia de outro Guimarães.
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