Lembram-se de há tempos vos contar que a leitura do "31 Songs" em plena paragem de autocarro me rendera fãs inesperados? Pois bem, além desses dissabores, retive alguma coisa do livro. A sério. Há algo na prosa de Nick Hornby que faz com que, enquanto ando a ler alguma das suas obras, comece a pensar como o homem, integrando expressões e atitudes das personagens no meu dia-a-dia. Isto pode parecer estranho, mas 1) não me acontece com todos os escritores 2) eu sou estranha.
Vem isto a propósito de um capítulo do "31 Songs" em que Nick Hornby fala da música de um grupo obscuro, que não deixou de ser obscuro por ele ter falado nele, ou lembrar-me-ia do seu nome, agora. Seja como for. Queria o senhor contar que a banda era de uns amigos, ou dos amigos de uns amigos, que para o efeito vai dar ao mesmo. E que por isso, e por vir com recomendação de outros amigos, lhe tinha prestado muita atenção, acabando por se apaixonar pela música. Diz Nick Hornby que devíamos ser amigos de toda a gente, para evitar os discos ouvidos à pressa (e logo postos de lado), e até mesmo aquelas rodelas compradas num impulso e que mal acabam por sair da caixa.
Lembrei-me disto por causa do disco que ando a ouvir há um ror de dias. "Bom Dia", dos Pluto. Como se devem lembrar, à conta da choraminguice derramada uns posts abaixo, esta é a nova banda do Manuel Cruz e do Peixe, espinha dorsal dos Ornatos Violeta.
Andava a evitar ouvir o disco. Tinha medo de ficar desiludida. (Lembrem-se, eu sou estranha). Mas graças ao Nuno Prata (ex-baixista dos Ornatos, que me disse maravilhas do "Bom Dia"), tomei coragem. Cá vai disto. Pronto. Ouvi. E agora?
Agora os Pluto não são os Ornatos, mas isso já eu sabia por tê-los visto ao vivo várias vezes. As letras e a voz só podiam vir do Manuel Cruz (embora os textos registem algumas diferenças, certamente para melhor adequação ao novo registo sonoro. E mais não digo se não ainda ficam a pensar que eu fiz um trabalho para a faculdade sobre as letras do homem, e tal).
Se este "Bom Dia" não fosse dito por quem é, talvez não chegasse à segunda audição.
Punha o disco de parte com aquele esgar de «não gosto lá muito» e passava ao próximo, ou voltava aos habituées.
Mas como tenho o MC e o Peixe em altíssima estima, insisti. Primeiro, ouvindo aquelas que me caíram mais no goto (ainda bem que não estamos a falar de um vinil, ou já o teria riscado na faixa 12), depois, pouco a pouco, alastrando a curiosidade ao resto do disco.
Estou viciada, constatei pouco tempo depois. Já me apetece ouvir o disco no autocarro, em altos berros logo pela manhã, decorar letras, ver concertos, assustar os vizinhos com aquelas guitarradas e delírios quase psicadélicos.
Ponho-me assim a pensar que quem tem razão é o Nick Hornby; e a imaginar que outros discos ando a perder, por não olhar para eles como se tivessem sido feitos por amigos meus.
A propósito de amigos: a vida, infelizmente, não sorri da mesma maneira a toda a gente, e enquanto os Pluto se passeiam, graças a Deus, por media avulsos, o Nuno Prata continua sem perspectivas de futuro... Perdoem-me por acreditar, mas digo que está ali um dos melhores autores de canções dos últimos anos, escritas com a mão no coração e um respeito carinhoso, engenhoso, pela Língua Portuguesa.
Se quiserem ouvir, chateiem-me. A sério, mando maqueta sem encargo.
Boa semana!...
Há 13 anos
1 comentário:
Excelentemente bem elaborado o texto.
Gosto muito de Pluto (porque um amigo me recomendou). Ao fim de um ano, ouvi: e gostei. Faz parte dos meus discos de cabeceira.
Essa ideia dos discos que posso andar a perder é-me tão fatal... "por não olhar para eles como se tivessem sido feitos por amigos meus."
Regards,
Olavo Pinto
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