Quando tenho de pegar no batente às sete da manhã, ponho o despertador para as cinco e quarenta. Os primeiros minutos são de re-habituação ao mundo; só a partir das seis menos dez, seis horas é que abro verdadeiramente a pestana e enfrento a dura realidade. Isto explica, obviamente, a quantidade de nódoas negras que ornamentam as minhas canelas e resultam de encontros mais ou menos imediatos, e madrugadores, com os móveis lá de casa.
Enquanto faço horas para apanhar o 42 das seis e... 42, tento ver o tempo que vai fazer, na Internet dos pobres: o Teletexto. É fácil e, sobretudo, rápido: apenas uma vida inteira para chegar à página 525 e um purgatório no Além para ver as temperaturas que interessam. Depois de me queixar do calor/frio que vai fazer, ainda me sobram uns segundos para espreitar esse mundo que é a Teleshop.
Com a aproximação do Verão, os produtos para emagrecer dominam quase por completo essas animadas emissões. Há tempos, descobri um produto chamado "Peel Away The Pounds": composta por um set de batidos e pensos adesivos, esta é a solução para quem quer deixar de vez as lojas "Olá, Gordinhas" e passar a entrar, sem complexos, na Bershka ou mesmo na Pimkie.
Além de colar um adesivo no braço, os interessados em comprovar a eficácia do produto são convidados a tragar uns estrambólicos batidos: mostram-se imagens fabulosas de americanos a enfardar em centros comerciais, e a ficar sem fome depois de uma goladinha no líquido-mistério. Anseio por uma versão nacional da coisa, com homens de barba rija a abandonarem pratadas de tripas e cozidos à portuguesa por uma amostra de sumo com espuma.
Aquilo que me deliciou, no entanto, foi a frase de alerta que surge no final do anúncio, naquela altura em que se dão números de telefone para comprar os engodos. O "Peel Away The Pounds" não pode ser consumido por grávidas, diabéticos e doentes de Alzheimer. Imagino, doravante, os benefícios trazidos pela mistela a criaturas embrionárias, pessoal com o açúcar a bater no tecto e gente que se esquece facilmente de onde tem de ir quando quer vomitar.
Entretanto, e porque também eu tenho de começar a compensar o tempo que passo no sofá, comprei, outro dia, uma singela bicicleta de manutenção, daquelas em que se pode pedalar despreocupadamente, enquanto se repara quais os sítios da sala que acumulam mais pó, ou se percebe como a música do disco que se está a ouvir e durante a qual jurámos pedalar ininterruptamente é, afinal, mais longa do que pensávamos.
Naturalmente, e depois de alguns dias de treino, estou já a vestir o 34 e a concorrer para figurante dos Morangos com Açúcar. Aquilo para que queria chamar a atenção, no entanto, é que os benefícios do aparelho começam muito mais cedo do que seria de esperar: comprei a bicicleta mais simples, mais leve e mais barata da loja, mas quando a tiro da caixa, vejo que vem desmontada em 300 pequenas peças, que tenho de apertar porcas e parafusos à mão, e que não percebo nada do livro de instruções. Muita asneirada depois, consegui: não sem antes perceber o princípio básico da Engenharia em Portugal («Não estou a ver onde é que isto encaixa... ai, que seca! Bem, fica assim, se cair logo se vê»).
Uma das peças cuja utilidade não fui capaz de descortinar estava no fundo da caixa. Vi-a no fim de montar a bicicleta e era uma jeitosa chave de fendas/parafusos/saca-rolhas multi-usos.
Boa semana!...
Há 13 anos
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