Um dia que me convidem para responder a um questionário de revista - e o tema não sejam os Homens da Luta - tenho de me lembrar que a resposta correcta à questão «qual o seu som favorito?» é: o trinado das andorinhas rasgando os céus de Abril a Setembro, mais coisa menos coisa.
Uma vez fizeram esta pergunta ao Hugh Laurie, num shóu da televisão, e ele disse: «o som de uma guitarra acústica mal tocada». Que o fazia sentir-se como um labrador a ser acariciado na barriga, e que não sabia porquê.
Eu acho que sei porque é que gosto tanto daquele chilrear histérico, mas breve, das andorinhas. Quando era miúda costumava ir para o portão de casa (dos meus pais & dos meus avós) ver passar as senhoras da fábrica (Coats & Clark). Saíam, as trabalhadoras, ao fim da tarde e eu e a Dona Maria, minha avó, ficávamos à porta do número 81 a vê-las, em passo apressado e carregando os seus haveres em saquitos, rumo a suas casas.
Era o entretém possível e é natural que esta fosse uma actividade de Primavera-Verão, o que explica que a banda-sonora que lhe associe seja aquele som agudo, alegre, efémero das andorinhas, simultaneamente um anúncio - do bom tempo que faria no dia seguinte! - e uma despedida - da jornada a que diziam adeus, no regresso, também elas, aos seus ninhos.
Ouvi-las agora, volvidas que estão umas boas bodas de prata, traz-me de volta esses dias de final alaranjado mas também a sensação de que o essencial perdura; as andorinhas, ainda longe da extinção, espero eu; os dias de calor; as estações em lógica rotação (apesar das ocasionais tempestades de granizo); as pessoas em movimento perpétuo, previsível.
Ou então só existem já em mim. Pesquisando por «andorinha» no Google, logo a maquineta de pesquisa me pergunta se não quero antes saber as últimas sobre os «andróides». Às vezes os meus quase 33 anos sabem-me a muitos, muitos mais. Mesmo sem coroa de espinhos.
Há 13 anos
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