sexta-feira, 9 de janeiro de 2004

Do sofá para o assento

Nem sempre a batata está no sofá. Este Natal, por exemplo, teve de se levantar cedo, no dia 27, para ir à Baixa do Porto trocar uns sapatos. Pequena estatura, mas pata larga, dirão alguns. Ao atravessar a ponte, de Gaia para a Invicta, avistei a origem da confusão mental do concorrente do "Quem Quer Ser Milionário", glosado no post abaixo: rapazes a fazer canoagem. E ainda eu me queixo por ter de caminhar quase duas horas, à chuva, para encontrar uma sapataria e outros estabelecimentos! Há quem se levante para ir remar para o Douro, um habitat tão frio como badalhoco, pelo menos naquela zona do seu percurso.

No regresso para a Margem Sul, o condutor veio em franca e animada converseta com um seu conhecido, instalado numa das primeiras cadeiras da camioneta. Comes e bebes, mas sem a parte do comes, eram o prato principal da suculenta conversa. «Se tu ali ao café é pela garrafa, imagino em casa! Só pode ser pelo garrafão!», alvitrava o passageiro. «Mas tens dúvidas? Claro que é!», confirmava o condutor, aparentemente sóbrio, enquanto passávamos a Ponte do Freixo (e Deus sabe que, se há coisa que eu detesto, é atravessar pontes, quanto mais com condutores bebedolas ao volante).

Mais à frente, viria o senhor a confessar que, naquela manhã, já tinha bebido «três cafés e três bagaços. Cheguei à Batalha às 7h, pumba! Depois em Crestuma, chamaram-me para ir tomar um café, outro!». Do terceiro café e anexo bagaço já não me recordo do cadastro, mas estaria, naquela altura, a fermentar algures no ensopado organismo do condutor.

«Mas eu nem bebo muito!», ia intercalando o nosso herói, que não é da televisão mas cujas proezas davam um filme. A páginas tantas, começa a partilhar com o povo que ia na camioneta (três ou quatro gatos literalmente pingados, mais o interlocutor directo da conversa) os seus planos para o dia seguinte, um Domingo:

«Por exemplo, amanhã vou comer a casa da minha sogra, e é feijoada, uma comida que puxa muito a bebida!»

Comecei a achar que a conversa tinha grande potencial para descarrilar ainda mais.

«Eu, sempre que como feijoada», dizia o condutor do chaço velho, «à noite, lá em casa, parece a Guerra do Iraque! PUM PUM PUM!», ilustrou, não satisfeito com a nauseabunda comparação.

Do outro lado da conversa, o silêncio (de fundo, as minhas gargalhadas abafadas).

«Então, não gosta de feijoada?!», indignou-se o condutor, perante a falta de resposta do companheiro.

«Gosto, gosto...», balbuciou o outro. Como diz o meu batato, um dia que o lixo reciclado de países como a Alemanha e a Turquia (!), usado nas camionetas daquelas empresas, dê de si às mãos de uma esponja ambulante, as entidades (ir)responsáveis hão-de abrir «um inquérito para apurar todas as responsabilidades». Até lá, este senhor que já deu de comer a não sei quantos milhões de portugueses vai continuar a fazer a desgraça de outros tantos.

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