segunda-feira, 30 de agosto de 2004

Sofá Não #1 (continuação)

Realmente eu vivi toda aquele febre com um entusiasmo adolescente, apesar de a panca ter desabrochado já eu passara dos 20. E onde? Precisamente nos jardins do Palácio de Cristal, na edição de 1998 do Ritual Rock. Conhecia uma ou duas músicas, vi o concerto sozinha e fiquei doida; fui logo para casa escrever um texto tosco que mandei para o "DN Jovem" (acho) e telefonar ao pessoal a espalhar a boa nova: há uma banda muito boa, são do Porto e cantam em Português, veja-se a bizarria, e eu adorei! Não era normal, à altura, e até nisso os Ornatos Violeta vieram revolucionar a minha vida.

À época, dizia então, achava que o Manuel Cruz se chamava Tiago e os nomes das músicas defendidas (ou atacadas? Na altura do "Cão!" eles eram tão viçosos...) naquele palco nada me diziam. Poucos dias depois, uma amiga em Lisboa passava por experiência semelhante, no Palco 6 da Expo. Juntas viríamos a vê-los, ainda naquele ano, num festivaleco de meia leca em noite chuvosa no Parque das Nações, no Montijo (olá, Célia!) e no Hard Club. São coisas que não se esquecem, como os primeiros dias de uma nova paixão, ou da Primavera, ou das férias grandes.

Depois do segundo disco, desde que houvesse dinheiro para a viagem de camioneta e o pão com chouriço no recinto das festas, íamos a todas (ou quase - nunca os vi no Algarve nem em Trás-os-Montes...). No final víamo-nos gregas para voltar a casa, mas achávamos sempre que tinha valido a pena.

É natural, pois, que com o final tenha ficado nas nossas bocas um «travo amargo da solidão» (outra citação). Sentimo-nos abandonadas. E connosco, muitos outros fãs que continuamos, hoje, a conhecer, a ver com t-shirts nos festivais. Há até quem faça sites, ou versões (os Clã do 'Capitão Romance', os Toranja da 'Chaga', e sabe Deus os pulos que o meu coração deu quando os primeiros acordes desta ode ao hino de corno soaram no palco tuga do Super Rock).

Talvez daqui a muitos anos haja uma reunião. Ou um concerto. Só um, pelo qual eu daria metade dos meus discos, as minhas poupanças (OK, esta não vale, eu não tenho poupanças), o recheio do frigorífico ou a totalidade do ordenado. Nem que tenha de aprender a tocar o instrumento de algum membro que recuse tocar nessa ocasião!

A última vez que fora ao Ritual Rock, vi os Ornatos cantarem uma versão ao piano do 'Mata-me Outra Vez'. Bem, a tocar; quem cantou foi o povo. Este fim-de-semana, não consegui abstrair-me disso e senti uma mistela de saudades, melancolia e raiva.

Acho que, apesar de tudo, é bom sinal. Estou viva. E vou continuar à espera de mais "Notícias do Fundo".



( eu estive neste showcase; foi na Valentim de Carvalho do Norte Shopping, estava cheia. )


Sofá Não #1: O Amor É Isto

Amei os Ornatos Violeta com uma intensidade dificilmente explicável em palavras. Uma paixão breve, porque o outro extremo da relação morreu, suicidou-se, apagou-se do mapa vá-se lá saber porquê (confesso que hoje também não sinto grande curiosidade; se acabou, acabou, e a resignação acaba por vencer. Como diria o Steve Wynn, «only the pain remains/the same the same the same»).

Chorei muito no dia em que o final veio escarrapachado nas páginas do "Correio da Manhã", e também quando, depois de um desmentido pouco convincente, o "Blitz" disse que a banda ia estar na Queima da Fita do Porto, para «o último concerto» da carreira. Vinha a descer a Rua Garrett quando dei com essa notícia, e as lágrimas caíram-me em catadupa pela cara abaixo. O último (triste) acto deste verdadeiro drama a conta-gotas aconteceu numa manhã de Inverno. Uma amiga, também aficionadíssima da banda, deu-me a notícia pelo telefone. Vi o DVD do "American Beauty" e no final aproveitei a cena da morte do Kevin Spacey (salvo seja) para chorar mundo e o outro. Fiquei doente e tudo, mas pelo menos dessa vez foi definitivo. Os Ornatos não mais voltariam a subir a um palco, para me dar alegrias como aquelas que vivi mais de 20 vezes, em várias terreolas deste nosso Portugal.

Este fim-de-semana, veio-me tudo isto (e mais alguma coisa) à cabeça. Fui ao Porto ver as Noites Ritual Rock, aquele festim de concertos de bandas nacionais que acontece anualmente nos jardins do meu adorado Palácio de Cristal. Em 2004, tínhamos no - excelente - cartaz Nuno, Nico (o fantástico projecto do antigo baixista dos Ornatos, Nuno Prata, e do seu amigo Nicolas Tricot) e Pluto, a banda em que alinham Manuel Cruz e Peixe, da mesma casa violeta.

Quis o destino ou algo mais que se encontrassem, na mesma noite, os novos grupos do defunto supergrupo. Musicalmente, pouco lugar a grandes conclusões: continuo a achar que, numa primeira audição, os meus ouvidos se apaixonam mais facilmente pelas canções do Nuno, Nico do que pelas guitarras dos Pluto. Mas quer uns quer outros (eu esforço-me e já tinha visto cada um dos grupos, ainda sem nada editado, por duas vezes) estão, como se diria no Fórum Sons, a crescer - e muito.

Enquanto consigo olhar para o Nuno Prata, tão tímido e tão bonito, e concentrar-me nas lindivinais letras da qual parece estar prenho, ver o Manuel Cruz e o Peixe em palco dá-me vontade de chorar. Emoção, mas não só. Sobretudo quando um dos mais talentosos artistas nacionais toca uma música, altamente reminiscente da banda que a gente sabe, e no final revela que ela foi escrita com o Nuno Prata, «para aquele que seria o terceiro disco dos Ornatos». Foi aqui que o nó que tinha na garganta se apertou definitivamente, e ainda bem que estava sozinha, para ninguém ver a minha fraca figura.

O Nuno Prata é um excelente escritor de canções, o Manuel Cruz e o Peixe têm química a rodos. Mas não há amor como o primeiro e sei que nada substituirá, no meu coração, a banda que me levou a andar em "digressão" pelo país, sempre sedenta de mais um concerto, de mais um encore, de mais um 'Há-de Encarnar' (um inédito que o grupo tocou ao vivo na tour d' "O Monstro...", e que eu e as minhas amigas adorávamos com devoção).

Quando contei estas "coisas" (outra bela canção, do segundo disco), o meu amigo Pedro Rios, que curiosamente entrevistou o Manuel Cruz na última edição do "Y", comentou: "Tanto amor...". E acho que nem a lucidez demonstrada pelo MC na dita entrevista chega aos calcanhares da argúcia deste novo escriba de valor, aqui na sua condição de melómano e camarada de lides musicais.

(continua)

Sofá Sim, Sofá Não

Alguns meses depois de ter aberto as portas deste tasco musguento, não resisto a criar uma nova rubrica, à qual chamarei - decidi-o durante o fim-de-semana - Sofá Sim, Sofá Não.

Porque tenho visto pouca televisão, e porque há paixões que falam sempre mais alto, impõe-se que arranje assunto para actualizar o Sofá com frequência de gente.

Os caros leitores importam-se que abra o livro de pautas?


quinta-feira, 26 de agosto de 2004

O poder da Internet

É bonito, o poder da Internet. Depois da denúncia de ontem, a Mulher Mais Antipática do Mundo falou-me.

Foi hoje de manhã: cheguei mais cedo ao bairro onde trabalho, e fui ao café onde ela vegeta, tomar uma meia-de-leite para aquecer e fazer tempo. Quando vou pagar, a mulher responde-me, em tom mecânico e piloto automático, um frio «bom dia».

Seria da hora (eram sete menos dez)? Estaria ainda a dormir?

Bem, retiro tudo o que disse, e o título que lhe atribuí. A empregada do nosso café de férias é, afinal, o Robot Mais Antipático do Mundo. Bom dia!

quarta-feira, 25 de agosto de 2004

Rádio Gilão

Passei umas breves, mas fantásticas, férias em Tavira, no mês passado. Uma espécie de regresso ao passado, já que dos 6 aos 18 anos, mais coisa menos coisa, foi aquela lindivinal cidade algarvia a emoldurar os meus Verões.

Lembro-me de o meu pai me ter tirado uma bela foto à porta da cosmopolita Rádio Gilão, quando era ainda teenager inconsciente.

Este ano, já «menina crescida», como cantaria a Manuela Azevedo, encontrei, em Santa Luzia (localidade vizinha, auto-proclamada "capital do polvo") aquele que penso ser o veículo de reportagem da rádio tavirense.

Observai:


A mulher mais antipática do mundo

A mulher mais antipática do mundo vive aqui à minha beira.

Em tempo de férias, o Senhor Zé, dono do café mais próximo da barraca onde trabalho, que cobra balúrdios por um lanchinho e tem um BMW, fecha o seu estaminé. Ficamos nós, trabalhadores esforçados mesmo em tempo de Verão, obrigados a calcorrear uma rua inteira até chegarmos a um outro estabelecimento (onde, por acaso, no ano passado ouvi um empregado contar ter apanhado, com os dentes, alguns «cabeçudos», ie peixes pequeninos, num mergulho na praia).

Aparte os comentários desse senhor, que costuma também contar a todos os fregueses como bebe um litro de leite («compro no Lidl, que é mesmo ao lado de minha casa!») todas as noites, antes de ir dormir, está-se bem naquele café-substituto. Excepto à entrada, ou à saída, quando nos deparamos com a Mulher Mais Antipática do Mundo.

Ela toma conta da caixa, onde há que ir pagar a despesa. E não há dia em que esboce um sorriso, balbucie um obrigado ou até um fugidio boa tarde. Nem aquelas palavras que nos saem inconscientemente (um «com licença» quando queríamos dizer «santinho»...) se ouvem por detrás da caixa. E ela não é mouca nem muda, pois o preço a pagar sabe bem dizê-lo. É apenas antipática, muito antipática. Nem se trata de ter um ar triste, que dessa estirpe costumo até ter pena. É carrancuda, sisusa, de cara inevitavelmente fechada.

Fico nervosa e mal-disposta quando sei que tenho de a enfrentar, pois não consigo evitar os mínimos da boa educação: os obrigados e bons dias que caem, invariavelmente, em saco roto.

Atribuí-lhe o prémio de Mulher Mais Antipática do Mundo quando ouvi colegas a queixarem-se do mesmo. Afinal, não é só com a minha cara que ela não engraça. Acho que é mesmo com a Humanidade em geral.

Tempos idos

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